Por Isolda Dantas
Em geral, nas análises sobre as mulheres em relação à conjuntura, é comum que a ênfase seja nos dados sobre opressão e carências vividas. Ou seja, o que lhes falta, os índices de maiores desigualdades em vários âmbitos, a violência, os problemas de saúde. O que prevalece é uma visão de que as mulheres são um grupo que está em uma posição de dependência, com uma vida bancada por alguém e que, portanto, contribui apenas de forma auxiliar, como uma ajuda, um complemento. Esta percepção, na verdade, está reforçando a visão de que uma família tem o homem como provedor e a mulher como a que cuida da reprodução, em casa.
A organização da vida e das políticas está baseada nessa suposta família patriarcal de homem provedor, em que o Estado atua como se sempre tivesse uma mulher disponível para complementar suas ações. O que temos é o não reconhecimento dos vários aportes das mulheres com o trabalho doméstico e de cuidados, com a gestão do acesso aos serviços públicos de saúde, educação. A desresponsabilização dos pais não é sequer algo de fato problematizada. Da mesma forma, a precarização do trabalho das mulheres não chega a ser olhada como um problema central. A divisão sexual do trabalho produz a desvalorização do trabalho das mulheres e atua como um elemento de pressão para a manutenção desse modelo, mesmo quando não há filhos.
Nesse texto, porém, queremos olhar para o lado real dessa situação. As mulheres contribuem muito mais que os homens para a produção da vida. Se tomamos as famílias com um casal de homem e mulher, mesmo com salários mais baixos, são as mulheres que esticam o dinheiro para dar conta de todas as despesas. Elas realizam o trabalho doméstico, são multifuncionais no cuidado para que tudo esteja organizado: o material escolar, o uniforme, as tarefas, as reuniões na escola, o agendamento de consultas, o acompanhamento das vacinas, a compra roupas, sapatos e sempre da maneira mais barata possível. E a lista poderia seguir quase interminável... Além disso, sempre estão atentas para ver se podem fazer um bico, complementar renda.
A pesquisa Mulheres e Trabalho, realizada pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) 2016, mostrou que enquanto apenas 51% dos homens assumem os trabalhos domésticos e do cuidado, ficando a taxa em 90% quando se trata das mulheres. O tempo gasto por semana com afazeres domésticos é ainda maior entre mulheres negras e mais velhas. Em contrapartida, segue crescendo o número de mulheres que trabalham fora de casa e na produção de próprio consumo, como é o caso das mulheres rurais.
O Censo Agropecuário do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 2006, último que teve os resultados apurados e divulgados, afirmou que o setor agropecuário do Rio Grande do Norte mudou muito nos últimos anos e destacou a agricultura familiar como responsável por 1/3 da produção do setor. Nessa mesma pesquisa, foi possível identificar que as mulheres eram responsáveis por 12,68% dos estabelecimentos agropecuários da agricultura familiar. São muitos os exemplos disso: desde às agricultoras, apicultoras, pescadoras e artesãs às mulheres que assumem tantos postos no mercado informal com serviços e vendas de produtos.
Por tudo isso, acreditamos que é preciso pensar políticas públicas que potencializem o trabalho das mulheres na esfera da produção a ponto de permitir uma maior autonomia. É fundamental questionar a divisão sexual do trabalho, tanto em relação à desvalorização das atividades femininas, como pelo fato de as mulheres arcarem, sozinhas, com o trabalho doméstico e de cuidados. Se a política enxerga isso, é bom para as mulheres. Se é bom para as mulheres, é para o desenvolvimento do Rio Grande do Norte e do país.
* Isolda Dantas é vereadora em Mossoró e deputada estadual eleita pelo PT.