(Ilustração: Renan Alves|) |
Por Eveline Ribeiro
Para falar sobre saúde mental nesse espaço é necessário aceitar o desafio de dizer em poucas palavras considerações sobre um tema interminável. Tanto vasto, quanto importante, questões relacionadas à saúde mental tem se tornado corriqueiras em nossas rotinas.
Procuro saber porque ainda parece tão difícil falar sobre saúde mental? Penso que a associação automática com “doença mental” e, consequentemente seus estigmas, seja um bom caminho para entender nosso comportamento resguardado sobre o assunto.
Mas, é importante lembrar que nas últimas décadas tivemos um grande acontecimento: a evolução do paradigma da saúde mental, que extrapolou conceitos puramente biológicos, e passou a considerar que os sintomas são fenômenos resultantes da interação complexa entre fatores genéticos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais.
Então, faz-se válido trazer o entendimento de que a nossa saúde mental está relacionada ao modo como vivemos. O que temos visto é um crescente aumento de impossibilidades sociais e profissionais por causa de problemas com nossa saúde mental. Então, podemos compreender que, mesmo em tempos de sofisticadas pesquisas e diversidade de psicofármacos, somente as pílulas não dão conta dessa demanda.
É chegado o momento de compreender que, para termos mais saúde caberá a cada um de nós aprender meios de transformar nossos modos de vida, nossas relações, nossas percepções, nossos estados de consciência e nossas condutas.
Já que estamos falando de aprendizado, parece apropriado que escola se envolva e se disponha a desenvolver estratégias para o aprendizado socioemocional. Trata-se de uma necessidade apontada também na rotina da nossa Escola nos últimos anos, quando foi observada uma evidente ampliação de situações envolvendo problemas e transtornos mentais. Essa informação coincide com dados epidemiológicos brasileiros que alertam para o fato do aumento percentual de quase 20% de alunos matriculados nas escolas que apresentam algum tipo de dificuldade que justifique o atendimento especializado na área de saúde mental. Além da alta prevalência, o impacto dessas dificuldades na vida do indivíduo é considerado o mais prejudicial entre todos os problemas médicos na população dos 10 aos 24 anos.
O lugar da saúde mental na escola é reforçado pela literatura especializada que traz esse espaço como sendo privilegiado para implementação de estratégias de promoção e prevenção em saúde mental para crianças e adolescentes. Certamente pelo fato da escola concentrar em um único ambiente a maior parte da população nessa faixa etária, por um longo período do dia, desde a primeira infância, podendo desenvolver um trabalho sistematizado e contínuo.
Além de poder sanar inseguranças e distorções comuns quando há falta de informações confiáveis e orientações especializadas, a escola pode também oferecer diversos espaços integrados de proteção ligados à saúde mental.
Em especial, a relação da escola com os pais é indispensável já que a participação da família nas atividades escolares estimula o desenvolvimento emocional e social das crianças e dos adolescentes. E quanto mais bem-sucedido for o diálogo entre a família e a escola, mais tangível será o resultado das atividades propostas.
Por esses motivos é necessário haver permanente fortalecimento de conhecimentos, das práticas e da parceria com a família. Mas também é importante retornar ao início desse texto quando falávamos sobre os modos de vida e seus impactos na saúde mental.
Isso porque se desejamos ter filhos com boa autoestima, relacionamentos construtivos, autorregulação, experimentando o amor pela vida e crescendo confiantes e autônomos, precisamos, antes, olhar para quem somos e como vivemos.
Todas as transformações que forem possíveis em nós mesmos refletirão integralmente na saúde mental de nossas crianças e adolescentes. Não é à toa que educar demanda tanta disposição e tempo. Isso se chama investimento parental. A cada diferente fase da vida os filhos necessitarão do nosso cuidado e isso é para sempre. Educar bem significa preparar o filho para viver e apoiá-lo até o fim.
É uma imensa responsabilidade saber que temos uma interferência inevitável sobre a maneira como nossos filhos se percebem e como eles se expressam no mundo. Por esse motivo, escolas e famílias devem estar de mãos dadas na longa jornada, caminhando passo-a-passo numa aprendizagem profunda e em um ensinar valioso. E, sejamos pacientes, pois como bem lembrou o poeta Charles Baudelaire: “Nada pode ser feito a não ser pouco a pouco”.
*Eveline Ribeiro é psicóloga Clínica e Educacional