Mossoroenses estão ressignificando a produção cinematográfica em Mossoró através de coletivos independentes
(Foto: cedida) |
Por Carol Ribeiro para o Saiba Mais*
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Reconhecida como a capital da cultura do Rio Grande do Norte, Mossoró tem uma história pulsante e embora já tenha incluído nessa trajetória mais de 12 salas de cinemas ao longo das décadas, passou por períodos de deserto nesta área. De 1908 até a chegada da televisão, e do videocassete posteriormente, a cidade acompanhou a época de ouro do cinema vivida no país e no mundo. Hoje, em outro contexto e cenário, a sétima arte vem ressurgindo não só para consumo. Mossoroenses estão ressignificando a produção cinematográfica em Mossoró através de coletivos independentes, que têm a paixão como principal motor para a realização audiovisual.
Para o cineasta potiguar Plínio Sá, é justamente da profusão artística mossoroense que nasce a produção local. "Mossoró tem dança tem teatro, artes plásticas, músicos. O audiovisual é o complemento, a junção de tudo isso".
São pelo menos cinco coletivos formados por jovens dispostos a articular o audiovisual na cidade e que já representaram a capital do Oeste Potiguar em festivais nacionais e internacionais e vêm movimentando a cena local com a realização, desde 2021, de um festival de cinema. Buraco Filmes, Cafundó de Gente, Brucutus, Crias e o Coletivo Audiovisual Improvisado.
Fruto da união de cinco jovens vindos do teatro para a produção audiovisual, o “Coletivo Audiovisual Improvisado” foi criado em 2023. O grupo trabalha, atualmente, na produção de um curta-metragem, o "Second Time", que poderá, além de participar de festivais, ser lançado na internet, conforme explica um de seus criadores, Halefy Brito.
Já Anderson Zero, um dos formadores do "Coletivo Brucutu", outro grupo recente, formado em 2023, acredita que é possível contar histórias em Mossoró para além do Cangaço, com ficção científica, comédia ou drama. Participante de edição do Fórum Nacional do LabMais do Sesc - projeto de onde se originou o coletivo -, em Petrolina/PE, Anderson fala com orgulho e emoção sobre onde conseguiu chegar em tão pouco tempo, exibindo curtas de 1 minuto Brasil afora.
"Era uma paixão meio platônica. Eu não tinha noção de que eu conseguiria produzir cinema em Mossoró. Participar do Fórum me abriu portas para conhecer também a realidade de diversos jovens no Brasil. E foi a primeira vez que viajei de avião. Então, da realidade que venho, filho de pai padeiro, mãe empregada doméstica, conseguir viajar para outro estado para ser painelista de um fórum nacional não é uma realidade que se faz presente constantemente", explica o jovem que pretende, um dia, viver do cinema.
História
Essa nova realidade audiovisual mossoroense começou por volta de 2008, através da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). As professoras Edileusa Martins e Ana Lúcia Gomes chegaram em Mossoró junto com o curso de Comunicação Social da instituição e trouxeram projetos de audiovisual através de editais, na área documental, que formaram os primeiros realizadores locais e deram o 'start' no novo significado do cinema mossoroense.
A diretora de audiovisual Wigna Ribeiro vem dessa época. Com um grupo de amigos formou o “Coletivo Buraco Filmes”, embora recente, o mais antigo de Mossoró, já responsável pela produção de dois longas-metragens, duas séries e quatro curtas-metragens.
Incentivos
De 2014 até 2019, o Buraco Filmes produziu "na raça", sem incentivo nenhum, "fazendo sessões do próprio bolso para levantar a própria grana para o próximo projeto", como explica Wigna. Entretanto, de 2019 para cá, passou a produzir só com prêmios e editais.
Na cidade que tem o teatro musical como maior tradição, as perspectivas de incentivos para o audiovisual são boas.
"Não conseguimos levantar uma obra de qualidade sem que a equipe seja minimamente paga. A meu ver, a Lei Paulo Gustavo (lei federal de financiamento ao setor cultural) vai mudar a situação, vai movimentar o setor e a economia criativa da forma com que ela tem que ser de verdade, com os membros pagos de forma digna", avalia Wigna.
Plínio Sá, um dos criadores do Cafundó de Gente, concorda e esclarece que produtores precisam ter consciência que um edital contempla toda uma rede de produção, e disso depende a qualidade técnica das produções.
"É feita a distribuição de pequenos valores como se a sensação de muitos contemplados fosse fazer a indústria do audiovisual funcionar, mas pelo contrário, se oferece três ou quatro mil para uma pessoa produzir pelo celular. Só que a qualidade técnica não vai ter um aporte. Nesse valor, a gente vai apenas colocar no youtube. A gente vai fazer essa obra competir em outro festival que provavelmente vai ter muitas qualidades técnicas? Como conseguir contemplar as diversas funções dentro de uma obra audiovisual?", ele questiona.
"Já viajei o Brasil visitando e estudando cinema, e o que a gente faz em Mossoró não deixa a desejar, se a gente implementar valores e orçamentos muito melhores nos projetos, tende a melhorar ainda mais e quem sabe transformar Mossoró num polo", complementa Wigna.
(Foto: cedida) |
Festival de Cinema de Mossoró
Foi com essa perspectiva que surgiu o Festival Alternativo de Cinema de Mossoró, o Facim.
Plínio conta que se questionou sobre a ausência de oportunidades de exibição da sua produção audiovisual e de colegas em Mossoró. Idealizado pelo Cafundó a partir de 2019, foi em 2021 que o Facim foi executado pela primeira vez, para "levar o audiovisual para a população mossoroense, para as periferias".
"O maior objetivo é tentar inserir esses artistas, tentar estimular a produção em Mossoró. Tivemos filmes do pais inteiro. O nosso festival é aberto ao nacional, mas o nosso objetivo é estimular cada vez mais a produção mossoroense. Eu entendo que articulando isso aqui, podemos tornar Mossoró um polo do audiovisual no Rio Grande do Norte e quem sabe no Nordeste. Quanto mais a gente tiver essa movimentação, mais o olhar fica voltado para Mossoró, mais forte fica o movimento", explica o cineasta.
"Juntos podemos ter mais voz que sozinhos. A classe aumentando tem efeitos muito positivos", diz Wigna.
A realizadora audiovisual Luiza Gurgel apoia: "Por que não fazer cinema em Mossoró? Há ideias criativas. O movimento serve também para desmistificar a ideia de que não se pode fazer cinema no interior potiguar, nordestino. É um movimento progressivo e subversivo para quebrar paradigmas".
*Essa reportagem faz parte do projeto "Saiba Mais de perto", idealizado pela Agência SAIBA MAIS, e financiado com recursos do programa Acelerando Negócios Digitais, do ICFJ/Meta e apoio da Ajor".
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